no Tumblr, respondendo perguntas de leitores.
sobre processos de lançamento e divulgação de livros:
Um lado de mim quer falar do livro, e as pessoas que me entrevistam são em geral atenciosas e inteligentes, mas explicar um texto literário, sua criação, seus elementos, suas intenções, pode trazer uma sensação de afunilamento das possibilidades de interpretação, ou de uma condução indevida da sensibilidade dos leitores. Então pra mim é sempre uma sensação mista, de equilíbrio na corda bamba. Em muitos casos eu não tenho nada a dizer sobre um certo aspecto do texto, mas a cordialidade me obriga a fornecer alguma resposta a uma questão, e depois fica um sabor leve de enganação comigo mesmo e com potenciais leitores. Em outros casos, fico contente de poder compartilhar minhas intenções a respeito de um aspecto qualquer do livro, porque de fato tinha um objetivo claro e queria alcançar determinada recepção que consigo expor com alguma eloquência et cetera. Em cima disso, tem a coisa da repetição, que logo começa a cansar, e da câmara de ecos gerada pela divulgação e pelos releases de imprensa, que por mais que sejam bem pensados tendem a plantar esses “memes” sobre os temas do livro que podem se tornar uma praga no sentido de reduzir o texto a um punhado de etiquetas. Isso pode ter o efeito, num segundo momento, de me levar a dizer coisas mais ou menos inventadas cujo maior objetivo é contrariar os consensos e chavões que começam a voejar em torno do livro, com se alguma dose de desconstrução pudesse libertar novamente o texto e a mim mesmo da câmara de ecos da discussão. Depois de muitos anos publicando livros, acredito que encontrei um ponto de equilíbrio que funciona pra mim, uma certa dose de ações de divulgação e entrevistas que me permitem oferecer instigações e respostas aos leitores, chamar a atenção de quem ainda não conhece meu trabalho, mas sem recair num processo que se torna aborrecido ou hipócrita pra mim. Quando tenho vontade de parar, eu paro. Sobretudo em relação às redes sociais, eu acho que precisam ser estabelecidos limites para que a conversa sobre o livro envolvendo minha participação não se transforme num exercício apelativo e redundante de replicações e gentilezas que se tornam vazias no ruído geral e não estabelecem exatamente uma conversa ou troca genuína, e sim uma reverberação algorítimica/mercadológica em que já não se pode separar atenção de distração.
sobre o futuro:
Sobre o planeta em 2050, algumas ideias estão em “O deus das avencas”, que não faz um exercício sério de futurismo mas ilustra alguns rumos que minha imaginação é capaz de conceber pro futuro (sendo ficção, não deve ser tomado como previsão embasada; por exemplo, eu não acredito que os artefatos hospedando cópias digitais de mentes que aparecem na novela “Tóquio” existirão um dia). Eu não arriscaria previsões firmes, mas acho que em 2050 estaremos de modo geral como dentro de um megafestival de rock às 3h30 da manhã, com lotação máxima e todo mundo já meio cansado, com fome, a comida desaparecendo das barracas de alimentação, o chão virou lama suja de mijo e lixo não degradável, e as pessoas começam aos poucos a procurar a saída, apenas pra descobrir que desse festival já não se pode sair, não há saída, na verdade estava avisado nos portões, havia até gente esclarecida gritando, tentando avisar e convencer a maioria a dar meia volta e mesmo entramos porque quisemos, porque todo mundo tava entrando, porque não pudemos evitar, afinal ia tocar nossa banda favorita, e algum jeito sempre se dá, não é mesmo? Não é mesmo?